O que sapatinhos vermelhos tem a ver com a Jornada da Heroína e sua volta ao mundo? A mochileira responde a seguir.
Mas antes, tenho uma confissão a fazer…
Praticamente nenhuma das roupas que usei durante as semanas de junho em que fiz visitas à Marinha e à Academia de Polícia egípcias, encontrei ministros e Primeiro-Ministro e dei entrevistas à TV do governo eram minhas. Aquele meme do “nem tenho roupa pra isso” foi real – não tinha nada que se assemelhasse ao “dresscode formal”… só o dresscode mochileira mesmo.
A SIMBOLOGIA DOS SAPATos
Por quase um ano não tive tênis algum. Desde que doei o único par que eu tinha pra um dançarino em Moçambique, me segurei pra não gastar grana em um novo – o dólar, meu pai… Por um tempo usei o All-Star emprestado de uma amiga no Quênia, mas estavam gigantes em mim – não eram meus. Foi quando comecei a perceber a simbologia por trás dos sapatos…
Então fez muito sentido que nenhuma de minhas amigas tivesse o mesmo número de calçado que eu – a única coisa que não pude emprestar de ninguém para ir ao programa do governo egípcio Nasser Fellowship for International Leadership foram eles, os benditos sapatos. Claro! Era a minha caminhada, de mais ninguém – eu que usasse meus próprios. Eu que escolhesse e investisse em um par.
Quando os vi na prateleira, eu suspeitei. Será? Foi só quando olhei o espelho que confirmei: lá estava ela, descabelada, moleca, louca e linda dando aquela piscadinha pra mim e confirmando – eu não fazia ideia do que iria acontecer nas próximas duas semanas, mas a Mulher Selvagem iria caminhando comigo.
E o que os sapatinhos vermelhos representam, afinal?
Nasceram para mim como referência ao conto de um dos capítulos de “As Mulheres que Correm com os Lobos”. Pra quem conhece, explico mais: não falo dos sapatos vermelhos comprados para ir à Igreja depois de a menina ter caído na cilada da gaiola de ouro, mas os que simbolizam sua vida criativa.
Logo, representam a jornada que estou criando pra mim. Onde eu já cheguei e pra onde estou indo. A força em ocupar espaços tão masculinos como mulher. A afronta em se fazer vista e ouvida – logo eu, que um dia já fui tão introvertida e insegura ao ponto de não defender minhas ideias nem conseguir abrir a boca em rodas de amigos e gaguejar perante chefes… eu anulava minha voz. Mas não mais. Eu escolhi sapatos vermelhos pra bancar a Heroína que venho parindo nessa viagem.
E eles me ensinaram muito. Despertaram a minha elegância em existir e resistir e um mindset de rainha que já vinha sussurrando lá no fundo. Me levaram às alturas da minha melhor versão. Também me mostraram que posso me bancar e me levaram a lugares inimagináveis, como uma reunião com o Primeiro Ministro do Egito e uma homenagem ao final do programa de liderança.
Mas, por fim, o despertar mais importante de todos foi o seguinte: nunca foi sobre os sapatos vermelhos, mas sobre a mulher que os calçava. Eu sou a dona deles e, se eles chegaram até aqui foi porque eu caminhei com eles, não o contrário.
O que segue no mochilão?
Alguns dias depois do N.F.I.L., minha amiga Pathi Flor fez a gentileza de lavar minhas roupas de mochileira com as dela na máquina do hotel. Voltou com a seguinte pergunta: “amiga, você gosta de tie-dye?”
O sabão do hotel tinha cândida.
Então eu “perdi” a maioria das minhas roupas, mas peguei o recado – elas não combinavam mais com a nova Marina, tinham de ir com o ciclo. E, bem… eu tive a chance de mandá-los de volta ao Brasil, mas decidi que os sapatinhos vermelhos vão seguir na volta ao mundo. Não só pelo que representam e porque agora fazem parte da minha identidade, mas de uma forma meio absurda sinto que ainda vou usá-los de novo…
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