Um sinal e um visto

Depois de sobreviver a um despejo de Couchsurfing e sossegar a cabeça na casa do Duli, um amigo que me acolheu no meio do turbilhão, pude organizar um pouco mais a vida. Tinha decidido ir pra Joanesburgo no dia do natal – único momento em que a passagem de avião equivalia à do ônibus; em vez de usar 18h entre as cidades, chegaria em 1h de voo. Lá, passaria dois dias e logo iria de ônibus pra Maputo, onde passaria o ano novo e iniciaria a viagem por Moçambique.

Mandei mensagem pra amiga de uma amiga que mora em Maputo contando da decisão. Ela só respondeu um “mas por que você passaria o ano novo aqui? Não tem nada. Vai pro Tofo! O Revéillon do Fátima’s é a mais famosa de Moçambique”. Hum…

A tal da virada era, na verdade, um festival pé na areia de cinco dias montado em frente ao Fátima’s, hostel que leva o nome da portuguesa que o criou. Mandei email só por desencargo de consciência – qual a chance de ainda ter lugar?

Mas tinha. A questão era outra – segundo a própria Fátima, eu precisava de uma carta-convite de um moçambicano pra poder aplicar ao visto. Procurei em tudo que foi canto na internet, mas achei um total de zero informações sobre isso. Achei esquisito. Então, lembrei de uma recomendação de airbnb em Maputo feita por uma amiga ainda no Brasil, o Matabicho, e escrevi a ele perguntando sobre. Ele respondeu pedindo meu telefone e me ligou na hora.

– Cara, como é que você está viajando e não sabe da carta-convite pra ter o visto?
– Mas Matabicho, não é todo país que pede isso!
– Cara, não pode ser, como é que você está viajando desse jeito? Agora eu vou ter que ir atrás dessa carta pra você, precisa pegar o carimbo do governo, como é que você deixa pra última hora?

Contei que eu não fazia ideia, que não encontrei nada na internet, que eu me sentia perdida, que não tive tempo de estudar o roteiro da viagem e contei do projeto em si também. Ele ainda reclamou que eu não tinha mais respondido no airbnb e eu expliquei que a diária dele era bem cara pra mim – R$ 140 a noite contra uma média de R$ 50 em hostel… fi, sou mochileira, né?

– Cara, vou te ajudar. Tem muitas mulheres aqui em Maputo pra você falar. Tem uma artista, uma escritora, uma militante também. Vou te dar os contatos e depois do ano novo vamos trabalhar. Você vem e fica no meu guest house como convidada, não tem problema. Mas você não deve vir pra Maputo no ano novo, não tem nada aqui. Eu mesmo vou viajar. Vai pro Tofo, no Fátima’s!

Raios, de novo essa história? Mesmo depois de saber que tinha lugar no Revéillon, não tinha me convencido. Ainda sentia culpa por não estar produzindo nada do projeto desde que parti do Brasil e não queria me dar o luxo de ir a um festival (imagina, que absurda a ideia de se divertir na virada do ano, né). Só quando a terceira pessoa repetiu o conselho é que confirmei o sinal: acho que eu deveria ir para o Tofo…

E lá fui eu atrás do visto. Matabicho correu e conseguiu me mandar a bendita carta-convite. Eu corri e consegui levar todos os documentos no consulado moçambicano em Cape Town no dia 20 de dezembro, uma sexta-feira, pra pegar o passaporte de volta na segunda, 23. Na marca do gol mesmo, já que provavelmente nada ia funcionar na véspera do natal.

Só um adendo:
Quem acampanhou o início da minha viagem sabe que passei por um perrengão logo de cara: não entrei no voo porque perdi a carteira da vacina da febre amarela segundos antes do embarque. Pra não correr esse risco de novo, grampeei o documento no passaporte assim como o meu passaporte antigo – ele ainda tem vistos importantes e válidos nele, então assim fiz pra não perder nada.
[Fecha adendo]

Dia 23. Tinham me pedido para ir entre 12h e 14h e fui. Porém, assim que a porta do elevador se abriu, dei de cara com um consulado fechado. Desci pra recepção, disseram que o pessoal devia estar chegando do almoço. Tá. Fui comer também. Voltei 13h e nada… esperei 30 minutos, desci de novo e pedi pelo amor de deus pra ligarem no celular do Brígido, que tinha me atendido no primeiro dia. POR SORTE ele tinha me passado, porque foi assim que descobrimos que o consulado estava de mudança e ele estava trabalhando no prédio novo. Em 10 minutos ele chegou e respirei aliviada. Mas quando peguei no passaporte e abri, UÉ. Nada de visto. Gelei com a suspeita do que tinha acontecido: comecei a folhear o passaporte antigo e pronto, tava lá. Não acreditei. Mostrei pro cônsul, ele se embananou. Disse pra eu voltar no dia seguinte às 10h. Me jurou de pé junto que estaria lá porque teria uma reunião com o embaixador da Albânia.

Às 9h59 estava lá e, pro meu alívio, Brígido também – dessa vez com o visto no passaporte certo (e um X feito com caneta bic por cima do visto anterior).

visto-moçambique

Missão cumprida. Tofo, meu bem, aguenta só mais um pouco pro nosso encontro 😉


Dicas sobre o visto moçambicano

Nem Jesus, nem a internet ajudam na causa dos viajantes que precisam tirar vistos no meio do caminho! As informações são desencontradas, as regras e pré-requisitos mudam o tempo todo e, muitas vezes, nem o site oficial da embaixada é atualizado. Então seguem aqui as informações que eu descobri na unha quando estive na África do Sul tentando tirar o visto de Moçambique no consulado [dezembro 2019]:

  • Não necessariamente você precisa da carta-convite: descobri quando cheguei lá no consulado que uma reserva no Booking também serve (imaginem minha cara hahaha). Nesse caso, leve impresso e tenha o endereço e as datas da estadia com você pois vai ser preciso colocar no formulário que entregam lá mesmo. E um ps: tem várias hospedagens que aceitam cancelamento antes de determinada data, então se sua intenção é decidir depois onde vai ficar, faça a reserva só pra aplicar ao visto mesmo. Acredite, é mais fácil: a carta-convite precisa ter firma autenticada e tem que levar uma cópia dos documentos do cidadão moçambicano também. #trampo
  • Além de Joanesburgo, tem consulado de Moçambique em Cape Town SIM! Navegando pela internet você encontra informações desencontradas sobre isso + telefones que não funcionam ou nem existem.
  • O valor do visto foi de R1000, cerca de R$ 330 na época. Eles pedem para que você vá até uma filial do banco FNB para pagar, você volta com o comprovante e deixa o passaporte.
  • O visto é de cerca de 1 mês, então importante ir quando estiver mais perto da sua viagem pra Moçambique.
Marina Pedroso

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