Tem uma situação que me tira do sério aqui no Quênia: é extremamente difícil encontrar um homem que não seja casado e extremamente comum vê-los em bares e restaurantes com namoradas ou acompanhantes. Quando questiono, ouço um “ah, mas a nossa cultura é assim…”
O machismo culposo…
Por jurisprudência, agora finalmente tenho um nome pra fenômenos que tanto encontrei (e que ainda vou encontrar) na minha viagem: Machismo culposo.
É fácil responsabilizar a ciência, a religião e a cultura pela forma como mulheres são vistas e tratadas. Pra justificar que não precisam da mesma educação (“pra que se vão ficar em casa cuidando de marido e filhos?”) e de emprego ou salários decentes (“o homem é que é o provedor, tem que trazer comida pra mesa e bancar a mulher”). Que precisam casar virgens e se cobrir pra não atiçar a sexualidade masculina (e pra não serem estupradas). Falácias camufladas de dogmas.
Um dia, um homem casado encheu a boca na mesa do bar pra dizer que trabalhava muito nos cinco dias da semana e que merecia aqueles dois de descanso (leia-se: passe livre pra sair com amigos e namoradas – a dele estava sentada ao seu lado, inclusive). Debochou sobre como ligava pra esposa avisando que não fizesse seu jantar pois chegaria tarde. Não aguentei e lancei a braba: “certo, e ela também tem um dia de descanso na semana?”
Olhar de espanto.
“Como assim, dia de descanso? Sou eu que trabalho, ela fica em casa com as crianças fazendo nada a semana inteira!”
“Hum… mas você ficaria um dia inteiro com as crianças?”
“Nossa, não aguentaria. Dá trabalho demais!”
Olhar de espanto – dessa vez o meu, que foi registrado com uma foto por testemunhas no bar:
…E o egoísmo feminino
Na mesma semana, uma amiga no Brasil me contou que tinha pedido ao namorado para dividir as tarefas de casa – estava exausta também com as demandas do trabalho e precisava de um tempo pra ela mesma. Foi chamada de egoísta.
Claro, a escala é outra em termos de liberdades e direitos, mas há um ponto em comum… Faz parte da mesma mentalidade machista. Nesse caso, entendam: uma mulher não é egoísta se decide focar nela mesma, na sua carreira, no seu sonho. Se ela se prioriza, vai atrás do que quer e fala não para o que não quer. Uma mulher não é egoísta se pede pra você não acompanhá-la ao cinema/bar/academia/viagem porque ela precisa ir sozinha. Se quer um final de semana quieta pra ler, escrever, dançar, conversar com outros mundos, respirar. Não é egoísmo ser livre. O nome disso tudo, aliás, é amor próprio. É ter vida interior.
Entendo que homens estejam habituados em serem o centro da atenção feminina. Em verem mulheres se dedicando apenas a filhos, namorados, maridos, família… vivendo em função de todo mundo, menos delas mesmas. É compreensível que muitos não saibam lidar com uma mulher que tem vida própria. Mas, né, também é aconselhável que se acostumem. Mais do que isso, que incentivem: porque são essas mesmas mulheres que também respeitarão e incentivarão a sua liberdade e os seus benditos dias de descanso.
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